Pão com ovo

Leio a manchete de que um traficante conhecido como Pão Com Ovo foi preso. Minha primeira reação é de surpresa: um traficante com esse apelido? Intrigado, clico no link da notícia e fico sabendo que, além de ser um dos chefes — não chef — do tráfico em Niterói, Pão Com Ovo era um dos criminosos mais sanguinários da região.

A segunda reação não é exatamente uma reação, mas uma lembrança.

Quando mais jovem, ali por volta dos dezessete, dezoito anos, eu e um grupo de amigos conhecemos, numa festa, três irmãs que moravam num bairro vizinho ao nosso, todas com mais ou menos a nossa idade. Um belo dia — na verdade, uma bela noite —, um desses amigos e eu resolvemos fazer uma visita às garotas (nessa época, amigos ainda utilizavam os passeios de suas casas para conversar).

Mal iniciamos a conversa e uma delas nos informa que, chegássemos alguns minutos antes, escutaríamos uma troca de tiros que acontecera ali perto, protagonizada por um bandido conhecido como Sete Capas.

Meu amigo, hoje casado e pai de uma linda menina, naquela época era um boêmio, um bon vivant — e um bonachão. Eu, prudente — ou assustado, que seja —, comecei a pensar num bom motivo para dar o fora dali o mais rápido possível. A desculpa tinha que ser plausível, como lembrar de repente de alguma importante tarefa a ser realizada em casa, ou que amanhã teria de acordar muito cedo. Mas tente ser cauteloso ou realista com um boêmio bonachão. Não dá certo.

Quando as moças falaram que o tal Sete Capas era um dos “bam-bam-bans” dali, que todo mundo tinha medo dele etc., meu amigo começou a fazer piadas com a alcunha do meliante. Ora, Sete Capas, até onde sabíamos, era apenas o nome de um biscoito. E foi por esse caminho que seguiram os gracejos.

“Cream Cracker estava junto?”, perguntou ele aos risos, nomeando, em seguida, quem seriam os cúmplices de Sete Capas: Maizena, Maria e Poca Zói — se bem que este último poderia, convenhamos, realmente ser o apelido de algum bandido. A gangue rival seria composta, meu amigo dizia, empolgado e matreiro, por Tostines, Bono, Negresco e Passa Tempo.

Foi engraçado, é verdade. Mas, enquanto eu ria, pensava na possibilidade de alguém passar por perto, escutar alguma coisa e ir chamar o bandido. Imaginação fértil — ou medo demais —, você pode dizer. Respondo dizendo que sou escritor, ora essa.

Por sorte, nada aconteceu, e voltamos para nossas casas sãos e salvos.

* Texto publicado originalmente no extinto site HuffPost Brasil e posteriormente no livro “Mais um para a sua estante”.

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